O agronegócio calcula perdas de R$ 40 bilhões por ano com o eventual fim da Lei Kandir, que isenta de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) todas as exportações de produtos primários e industrializados semielaborados.
Produtos primários são aqueles que não recebem nenhum tipo de processamento físico-químico. Alimentos são alguns exemplos: carne, soja, trigo, milho, café em grão, frutas e verduras, entre outros. São incluídos também produtos como alumínio, minério de ferro, petróleo, cobre, estanho, zinco, chumbo, níquel, ouro e prata.
Produtos industrializados semielaborados são um passo intermediário entre o produto primário e o bem de consumo. Ou seja, material que pode ser utilizado na produção de outro produto semiacabado ou acabado, como celulose.
As perdas para os exportadores agrícolas seriam de R$ 40 bilhões, de acordo com Bartolomeu Braz Pereira, presidente da Aprosoja Brasil (Associação Brasileira dos Produtores de Soja).
Ministro Guedes diz que lei “morreu”
O governo não fala em acabar com a lei, até porque ela só poderia ser extinta se o Congresso a revogasse ou criasse uma outra lei complementar em seu lugar.
Mas numa audiência no Senado ao final de março, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a Lei Kandir “morreu”, porque, segundo ele, o governo não consegue cumprir há 20 anos com os repasses exigidos por essa lei aos estados.
Fim da lei provocaria demissões
O fim da Lei Kandir provocaria impactos significativos, segundo o presidente da Aprosoja. Para ele, os impostos para o produtor rural aumentariam, e isso, por sua vez, levaria a uma redução de investimentos no setor.
“Isso certamente causaria desemprego no setor rural, o que, segundo nossas estimativas, poderia chegar a 200 mil ou 250 mil empregos diretos e indiretos perdidos só na cadeia da soja”, afirmou Pereira.
Isenção está prevista na Constituição
Ralph Melles Sticca, professor do MBA de Gestão Estratégica do Agronegócio da FGV (Fundação Getulio Vargas), disse que a renúncia fiscal imposta aos estados por meio da Lei Kandir tem previsão constitucional. Portanto, os pontos mais sensíveis da discussão no Congresso seriam o tamanho da compensação por parte da União e o fim da vedação aos créditos de uso e consumo a partir de 2020.
“Onerar o setor que mais cresce e traz divisas ao país por meio das exportações, para dar maior receita aos estados em dificuldades financeiras, não me parece adequado, principalmente no momento em que o país precisa gerar empregos”, disse Sticca.
Ainda segundo o presidente da Aprosoja, as exportações totais também poderiam cair substancialmente, gerando déficit na balança comercial. “Com menos entrada de dólares no país, a moeda nacional perderia valor e os produtos básicos da alimentação teriam elevação nos preços nas gôndolas dos supermercados”, disse.
Dívida com estados chega a R$ 700 bilhões
Desde sua criação, em 1996, pelo então ministro do Planejamento Antonio Kandir, no governo de Fernando Henrique Cardoso, a lei tem provocado discussões intermináveis entre governadores e exportadores.
Os governadores alegam perda de arrecadação devido à isenção do imposto nesses produtos. Os exportadores avaliam que o fim da lei traria impactos para toda a cadeia exportadora e não só para ao agronegócio.
Para compensar as perdas de arrecadação, a Lei Kandir obrigou a União a ressarcir os cofres estaduais. Com isso, as transferências obrigatórias da União levaram a uma dívida entre R$ 600 bilhões e R$ 700 bilhões, montante que, segundo o ministro Paulo Guedes, é impossível pagar, sob o rico de o governo federal quebrar.
Governo estuda criar novo imposto
Segundo a Aprosoja, o governo federal vem trabalhando com a possibilidade de criar um imposto federal compartilhado, cuja arrecadação seria dividida entre os estados. O montante seria até maior do que o ressarcimento previsto pela Lei Kandir e pelo FEX (Auxílio Financeiro para Fomento das Exportações).
Ao UOL, o Ministério da Economia disse, por meio de sua assessoria, que no momento vem estudando esse novo modelo de distribuição de recursos”. Afirmou ainda que haverá uma garantia para que nenhum estado perca recursos em relação às últimas distribuições de FEX e da Lei Kandir.
“O objetivo do Ministério da Economia é aumentar a descentralização de recursos para os entes federados e encerrar as discussões sobre a Lei Kandir, mudando a forma de transferir recursos da União para estados e municípios”, disse o ministério por meio de sua assessoria.
Governo e estados discutem compensações
Até lá, entretanto, governo e estados continuam discutindo se é devido ou não a compensação da isenção das exportações. O Comsefaz (Comitê dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal) argumenta que existe passivo anual de R$ 39 bilhões com os estados.
Segundo o Ministério da Economia, o TCU (Tribunal de Contas da União) e o ministério já evidenciaram que a regra de cessação (interrupção de transferências) está válida, pois mais de 80% da arrecadação já está no destino.
“Extinguir a Lei Kandir não nos parece uma opção, seria contrariar a lógica. Exportar impostos, desestimular os empresários rurais e lançar o setor em uma recessão”, disse Pereira.
Fonte: Uol Economia.